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Raros encontros: a minha história com os arcades

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Sinônimo de videogame para muitos jogadores, os arcades estiveram presentes em shoppings, bares e botecos ao redor de quase todo o Brasil, marcando uma geração que cresceu gastando a mesada com fichas. Porém, essas máquinas de jogatina dificilmente apareceram no interior do país, deixando alguns gamers, como eu, órfãos de uma experiência cotidiana nos fliperamas.

Fantástico mundo novo

Como entusiasta dos jogos eletrônicos, eu sempre fui um leitor de revistas sobre videogame. Eu não me contentava apenas em jogar, tinha que saber tudo sobre aquele universo que me fascinava. Por isso mesmo eu lia todas as publicações especializadas que encontrava, como a Gamers, SuperGamePower, Ação Games e a Nintendo World.

Mesmo acompanhando essas revistas, tinha algo que sempre me parecia muito distante e de difícil compreensão: os arcades. Em quase todas as análises aparecia o seguinte texto: “é um ótimo jogo, mas ainda está longe da versão para arcade”. Mas, afinal, que videogame poderoso era essa que sempre possuía as melhores versões dos jogos?

Arcade? Fliperama? Essas eram palavras inexistentes no vocabulário de São José do Seridó. Por aqui, os primeiros videogames chegaram no começo da década de 1990. E já era a geração 16-bit, com o Mega Drive e o Super Nintendo. Uma máquina grande, cheia de botões e com a própria tela, como apareciam nas revistas, eu nunca tinha sequer avistado.

Sonho distante

Sem referência alguma além do que lia nas revistas de videogame, eu sempre imaginei que os arcades eram coisas que só existiam nas maiores capitais brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, e ficavam sempre em lugares onde o poder aquisitivo era maior. Eu não fazia ideia de que, assim como as locadoras daqui, eles estavam em bairros carentes em comércios “modestos”

Sendo assim, continuei minha vida gamer sem esperança de jogar uma dessas um dia. Lembro de passar batido pelas páginas das revistas que traziam matérias sobre os arcades e de nem me esforçar para conhecer melhor os títulos que saiam para as máquinas. Contudo, de uma forma quase tão impactante quanto foi para mim acompanhar o noticiário do atentado terrorista de 11 de setembro, nos EUA, em setembro de 2001 eu finalmente vi, pela primeira vez, um arcade na minha frente.

É festa

Durante o mês de setembro, São José do Seridó se transforma por causa das festividades alusivas ao padroeiro da cidade. As pessoas reformam as casas, as ruas são pintadas, as lojas trazem roupas novas e o centro da cidade recebe o parque de diversão, bandas musicais e dezenas de camelôs. A calmaria típica dá lugar à agitação durante a metade do mês.

Foi justamente no período da festa do padroeiro que uma barraquinha em particular chamou minha atenção durante a noite. Eu estava saindo da Igreja depois da novena, quando comecei a ouvir alguns sons familiares. Continue descendo os degraus da escadaria da Igreja e me aproximando da praça, quando me dei conta de que sabia muito bem do que se tratava aquela barulheira.

Olhei para uma barraca no centro da rua, uma espécie de tenda enorme. De onde eu estava consegui avistar várias luzes e um barulho de pessoas rindo e sons de TV. Naquele instante eu pensei: “montaram uma locadora no meio da rua. Eu preciso ver isso.” Corri, deixando os meus pais para trás, e já fui tirando as moedas do bolso. “Nossa, uma locadora no meio da festa. Será demais”, eu pensava.

Mas, quando cheguei até a tenda, era muito melhor e mais mágico do que eu imaginava. Debaixo de uma barraca de lona, estavam dispostos dezenas de arcades, cada um com um game mais incrível do que o outro.

Realidade fantástica

Eu fiquei em choque. Parado, no centro da barraca, eu via o mundo girar ao meu redor, passando em loop por todas aquelas máquinas maravilhosas cheias de jogos. Para onde eu olhava, via arcades. Eram uns vinte, se a emoção não me enganou. Máquinas enormes, barulhentas e com controles que eu nunca tinha visto.

Sem saber se ria ou se chorava de emoção, fiquei como um louco percorrendo cada cantinho daquela barraca. Street Fighter Alpha 2, Mortal Kombat 3, Final Fight, Cadillacs and Dinosaurs, Tartarugas Ninja, SuperSidekicks, The King of Fighters 97 e 98 e vários jogos de nave que eu nem lembro mais. Aquilo parecia um sonho.

Lembro de parar várias vezes para me perguntar se aquilo era mesmo real, já que nunca São José do Seridó tinha recebido um arcade na sua história. Mas era real mesmo. E no momento em que recuperei a consciência, fui correndo até o responsável pelo espaço para dizer que queria jogar uma hora.

Dura realidade

Uma hora? E você é tão bom assim?”, disse o dono do arcade quando perguntei quanto custava uma hora. Até hoje consigo ouvir a risada do malandro. Nem eu sabia como um arcade funcionava e nem ele tinha a ideia de que ninguém ali tinha experiência com aquele tipo de “brinquedo”. Mas, depois de umas boas risadas e de uma aulinha básica sobre o funcionamento das máquinas, comprei cinco fichas por R$ 2,00 para jogar Street Fighter Alpha 2.

Era tudo muito diferente, começando por ter que liberar a jogatina com uma ficha. Mas, estava sendo divertido. Escolhi Ken e comecei a luta. Logo nas primeiras cenas percebi que realmente as revistas não estavam brincando quando diziam que os arcades possuíam as melhores versões.

O game era lindo, com gráficos magníficos e uma velocidade absurda, muito diferente da versão de Super Nintendo que eu conhecia. A minha admiração com a beleza do jogo durou pouco tempo. Com alguns golpes, enquanto eu prestava atenção na movimentação suave dos personagens, o inimigo aplicou uma sequência descontrolada de golpes e me venceu rapidamente. Deixei de lado o deslumbre e resolvi jogar. Segundo round e nem consegui encostar no adversário.

“Que maldição de dificuldade é essa?”, gritei depois da derrota. Só podia ser o controle diferente que eu não conhecia. Por isso, dei mais uma olhada nos comandos e quando tentei apertar start para voltar ao jogo, nada acontecia. “Ei moço, não tá pegando o botão pra começar”, falei para o dono do lugar. O cara riu e disse: “só continua se colocar outra ficha, moleque”.

Saudade das locadoras

Eu quase não tinha jogado, mas já sentia falta das minhas queridas locadoras. Como assim, em poucos minutos eu já tinha perdido uma ficha? Bom, coloquei outra ficha e fui para a luta. Dessa vez com Ryu, e apelando muito, venci o combate. Até ganhei mais umas duas lutas, mas a dificuldade era insana e em menos de 20 minutos eu tinha perdido todas as minhas fichas.

A raiva foi grande na hora da derrota, mas assim que me acalmei comecei a rir sozinho no fliperama. Aquela era uma experiência única, que eu nunca tinha vivido. “Quer saber? Vou aproveitar”, falei para mim mesmo. Comprei mais um monte de fichas e sai testando quase todos os jogos. Foram horas de diversão, conhecendo novos games, jogando contra outras pessoas e aproveitando a oportunidade de ter um fliper ali, próximo a mim.

Foram dez dias de festa. E foram dez dias que passei gastando toda a minha mesada com fichas no fliperama. Já tinha insistido tanto em alguns games que tinha me tornado verdadeiramente bom. Um deles era justamente o Street Fighter Alpha 2. Até zerar eu já conseguia, além de ganhar de quase todo mundo que passava por lá. Também aproveitei para jogar com meus irmãos. Juntos, gastamos dezenas de fichas na Tartarugas Ninja e outros “brigas de rua”.

Nunca uma festa de padroeiro tinha sido tão divertida para mim. Mas, infelizmente, ela dura pouco. E quando o mês acabou, precisei me despedir do “paraíso”.

Novos encontros

Outras festas de São José vieram e o dono do Fliperama retornou mais umas três ou quatro vezes, sempre em setembro. E era só assim que eu conseguia jogar num arcade, pelo menos até começar a visitar meu amigo Kériclis, em Natal, a capital do Estado.

Sempre que ia para lá, a partir de 2006, um dos principais destinos era o GameStation, que fica no Midway Mall, o maior shopping center do estado do Rio Grande do Norte. Quando fui lá pela primeira vez, meu amigo já me levou ao fliperama. E era lindo, com máquinas de todos os tipos, incluindo os games de luta que eu tanto adorava e mais um monte de outros jogos.

Como sempre fomos apaixonados por videogames, jogar no GameStation se tornou tradição em nossos encontros semestrais em Natal, nos períodos de férias escolares. Jogávamos Marvel vs Capcom ou qualquer jogo de luta que estivesse ali. Apenas pelo prazer da jogatina. Embora usássemos cartões em vez de fichas, nada tirava a magia de poder se divertir em máquinas que eu considerava tão místicas.

Raros encontros

Por muitos anos os arcades foram um sonho distante para mim. Lia em revistas e imaginava como seriam maneiras. Demorou. Demorou muito! Mas eu pude vivenciar, mesmo que por raros momentos, a experiência de jogar num fliperama e gastar algumas fichas com grandes jogos. São momentos que levarei por toda a minha vida, principalmente por ter aproveitado intensamente cada minuto com essas “máquinas de sonhos”.


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Ítalo Chianca

Ítalo Chianca

Gamer que cresceu jogando com seus irmãos, lendo revistas sobre games e frequentando as antigas locadoras de videogame, hoje divide o seu tempo livre entre as jogatinas e os textos sobre games que costuma publicar no Jogo Véio e nos seus próprios livros (Videogame Locadora, Os videogames e eu, Papo de Locadora, Game Chronicles e Gamer).

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