Pesquisar
Close this search box.

Histórias do Asilo: Um Game Boy, um fusquinha e os tempos difíceis

compartilhe!

Toda paixão tem um começo, uma pequena centelha que conduz à
maior das chamas quando devidamente cultivada…

Lembro que tive meu primeiro contato com um videogame ainda na década de 1980, quando precisava seguir as instruções do meu pai para matar um goomba ou pular um buraco que fosse no Super Mario Bros.

Seu Roberto, o meu velho, sempre foi dos mais entusiasmados com tecnologia, do tipo que lê publicações do gênero e quer ser dos primeiros a experimentar novos gadgets (ainda hoje). Na época, ele vivia às voltas com um CP300 para depois arranhar um MSX. Ter um videogame em casa era obrigatório e eu o agradeço imensamente por isso, já que tive Nintendinho, Master System, Mega Drive, Snes e tantos outros, sempre acompanhados por muitos bons jogos e revistas da época. Mas em um dado momento, a situação apertou até um ponto preocupante (para ele, eu era criança). Mesmo assim, a paixão só fez crescer.

Vou culpar a Economia, porque do alto dos meus 10, 12 anos, não dava pra culpar outra coisa. PlayStation, bicicleta, Parque da Mônica, viajar para a Disney; nada disso fez parte da minha infância.

Quem não tem cão…

Menino esperto, tinha ciência de que o período era de vacas magras, e mesmo assim aproveitei o máximo que pude. Na época, meu pai estava desempregado e as perspectivas não eram tão boas. Um novo videogame era um sonho distante, amenizado pelo escasso dinheiro do lanche muito bem empregado nas locadoras: “Tia, uma hora de PlayStation, por favor!”, tudo para morrer de amores por Mortal Kombat Trilogy ou qualquer outro jogo que fosse capa da Super GamePower. Naquela época, aliás, não sobrava dinheiro para as revistas. Restava o amor platônico nas passadas pelas bancas de jornal.

Nos bares de esquina, máquinas de caça-níquel por todos os lados. Era período de Copa, então as máquinas tinham bandeiras de países em cada um dos seus slots. E é divertido lembrar que, embora fosse ilegal, o dono do bar perto de casa nunca tenha manifestado nenhuma objeção ao moleque cheio de moedas para jogar: Croácia, uma figa, uma moedinha perdida. Argentina, acho que agora vai! BRASIL! E uma torrente de moedas de 25 centavos despencava no chão, muito mais do que minhas mãos espalmadas podiam segurar.

Passado o olhar de desaprovação dos mais velhos, pro diabo a vergonha: isso aqui deve render umas 10 horas de PlayStation, ou umas 20 fichas no fliperama do Seu Manoel! E lá ía eu, passar a tarde inteira jogando, sem dizer uma palavra ou mover uma pálpebra sequer.

Plot-twist: Fusquinha era um menino

Durante a febre Pokémon, admito que foi um pouco mais complicado lidar com as dificuldades de casa. Estar exposto a todo momento a algo que você quer muito é extremamente complicado. Por todos os lados, Game Boys de todas as cores e modelos, com cartuchos vermelhos, azuis e amarelos. Via o desenho na TV, folheava a Pokémon Club nas bancas de jornal e ainda não tinha saciado a vontade de ser parte daquilo tudo. Mesmo assim, suportei calado para não dar mais preocupações em casa, ciente de que era só mais uma vontade infantil, algo supérfluo.

Certa vez, consegui juntar algumas moedas e fui até o ‘Armarinho da Dona Rosalina’, na rua de baixo, comprar um caderno meia-pauta que viria a servir como a minha PokéAgenda. Nomes, tipos, ataques, evoluções… Tudo era perfeitamente documentado, exatamente como fazia o Ash às 11 da manhã, durante o programa da Eliana. Meus pais viam tudo de perto, sabiam que a molecada toda fatalmente pediria um Game Boy de Natal, e eu não seria uma exceção. Consciente, sim, mas ainda assim criança, né?

Mas meu pai realmente sempre foi dos mais incentivadores. Uns bicos aqui e ali e eu tinha um Game Boy Pocket prateado com Pokémon Red. Usado, meio surrado, comprado por R$30,00 de um conhecido da escola, o Fusquinha. O apelido deve ter uma história que eu gostaria muito de contar aqui, mas que eu desconheço. Andei com aquele Game Boy pra cima e pra baixo por muito tempo, vivendo e revivendo as mesmas aventuras monocromáticas. Querem saber o meu time? Lá vai: Charizard, Golem, Raichu, Gyarados, Gengar e Alakazam!

Com o passar do tempo, consegui outros cartuchos, outras versões de Pokémon e, eventualmente, até mesmo um outro Game Boy (Color, que eu acabei vendendo e me arrependo até hoje). Mas o Pocket ainda está aqui comigo, guardadinho, com a tela escura e precisando de alguns reparos.

Tudo na vida tem um lado positivo, mesmo quando as coisas parecem piores do que você é capaz de suportar. Sem as dificuldades, talvez eu hoje não soubesse apreciar o esforço dos meus pais, as conquistas que obtive ou o suor empregado naquele Game Boy Pocket de trinta reais comprado do Fusquinha.

Amor pelos videogames eu sempre tive, desde bem pequeno. E tenho certeza de que herdei isso do meu pai. Dele também vieram outros valores como a coragem, a resiliência, a nobreza e a honestidade. E eu espero poder passar tudo isso para o meu filho um dia também.


E aí, curtiu esse post? Se inscreva no nosso Canal no WhatsApp e fique por dentro das novidades sobre games e animes, além de conferir conteúdos exclusivos do Jogo Véio.

Eidy Tasaka

Eidy Tasaka

Redator e diagramador freelancer, apaixonado por jogos e revistas antigas, incentivado por um pai que sempre nutriu os mesmos vícios. Fã de RPGs japoneses e jogos de plataforma, divide seu tempo entre o Jogo Véio e as poucas horas de sono que possui.

Veja também

Espaço da Veiarada