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Dreamcast: uma segunda chance para amá-lo

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Um videogame novo que não agradou aos jogadores das locadoras, mas que fez a festa de uma turma inteira de amigos. Essa é a minha história com o saudoso Dreamcast da Sega durante o começo da década de 2000.

Máquina poderosa

Quando uma locadora de videogame nova abria na cidade, era sempre uma festa. Novos jogos, videogames que só se visto nas revistas e guloseimas deliciosas para acompanhar a jogatina faziam parte do pacote de uma abertura. Foi justamente por isso que passei duas horas na fila quando o senhor Tadeu anunciou que abriria a sua nova locadora em São José do Seridó/RN depois de um longo hiato fora da cidade.

Meus amigos e eu não víamos a hora de conhecer o novo templo da diversão da cidade. A espera era angustiante, principalmente pelo fato de sabermos que um videogame que nunca havia sido visto na cidade faria parte do acervo da nova locadora do Tadeu.

Ninguém sabia qual era o novo console, mas chutávamos que poderia ser um Saturn ou até mesmo um Neo-Geo. Mas, para a surpresa geral da comunidade gamer local, Tadeu abriu as portas da sua nova locadora com boas-vindas dadas por Sonic e companhia, rodando no poderoso e imponente Sega Dreamcast.

Videogame dos sonhos

Eu nunca tinha visto um Dreamcast pessoalmente até aquele momento. E, como eu sonhava, ele era realmente incrível. Branco, pesado, com belos traços e um visual futurista, aquela máquina da Sega nos colocava em uma nova geração de videogames. Mais do que sua aparência moderna e controle cheio de tecnologia, o que mais me chamou a atenção foi a qualidade técnica dos seus jogos.

Quando a locadora foi aberta numa manhã de domingo, Sonic Adventures já rodava convidativamente, para que todos pudessem se deleitar com todo o poder gráfico do 128-bit da Sega. Texturas limpas, belos efeitos de luz e sombra, dublagem nos personagens e um mundo colorido e vasto faziam a turma suspirar. Nada podia ser mais real do que aquilo, todos comentavam.

Outros jogos também estavam disponíveis naquele dia, como Crazy Taxi, que fez a festa da garotada por meses. Foi uma febre enorme guiar os passageiros loucamente naqueles taxis do Dreamcast. Porém, o console tinha uma falha muito grande para as locadoras da cidade naquele período: não tinha uma grande game de futebol.

Queremos boas peladas, Tadeu?

Na primeira metade dos anos 2000, Winning Eleven reinava absoluto nos dois PlayStations da locadora. Era bastante comum chegar para jogar e dar de cara com todas as TVs reluzindo verde por causa das partidas de futebol no console da Sony.

Campeonatos, disputas de quem perder paga e o instigante modo “carreira” no qual se comprava e vendia jogadores enquanto disputava os principais torneios do mundo era uma das principais fontes de renda das locadoras.

Infelizmente, o Dreamcast não tinha um jogo tão bom desse gênero esportivo. Virtua Striker até tentou, mas não agradou aos jogadores. Sem retorno financeiro, Tadeu começou a substituir os consoles da Sega por outros PlayStation. Porém, meus amigos e eu adorávamos o videogame. Jogávamos Power Stone, Soulcalibur, Capcom vs. SNK, Crazy Taxi, e tantos outros. E ver o nosso queridinho saindo da locadora, significava que não poderíamos mais jogar aquelas pérolas.

Esquecido

Renegado pelos jogadores da locadora, parecia que o Dreamcast teria, em São José, o mesmo fim que teve no restante do mundo. Todavia, em um gesto desesperado, meus amigos e eu fomos em caravana até a locadora do Tadeu fazer uma proposta de resgate.

A ideia era comprar os três Dreamcast que faziam parte do acervo da locadora. Um para cada amigo. Sem qualquer tipo de apego, Tadeu nem negociou e aceitou prontamente a proposta. Disse que venderia cada um por R$ 80,00. Com o valor dos três, ele poderia comprar um novo PlayStation, muito mais rentável para o seu comércio.

O preço estava ótimo, mas éramos apenas garotos sem qualquer tipo de renda. Sendo assim, o jeito foi desapegar do que já tinhamos em casa em prol do sonho do console novo. Com isso, mudamos a proposta e cada um ofereceu o seu próprio PlayStation em troca de um Dreamcast.

Se o dono dos Dreamcast já tinha gostado da primeiro proposta, agora é que o negócio tinha ficado bom de verdade. Sem ao menos titubiar, e transbordando animação, Tadeu aceitou o negócio e ainda voltou um Super Nintendo na troca. Ficámos sem nossos preciosos 32-bit da Sony, mas conseguimos salvar o Dreamcast de um triste fim.

Novo parceiro

Daquele momento em diante, o meu grupo de amigos voltou toda a atenção para o novo videogame. Passamos a vasculhar as nossas revistas em busca de nomes de jogos. Pesquisávamos durante a aula de informática sobre outros títulos desconhecidos. Descobrimos até um sujeito que vendia CDs piratas na cidade vizinha.

Em pouco tempo, montamos uma ótima biblioteca de títulos que nos divertiu por anos. Durante esse período, jogávamos Shenmue, Resident Evil CODE: Veronica, Marvel vs. Capcom 2, Jet Grind Radio, Quake III, Daytona USA, Blue Stinger e Sonic Shuffle. Esse último, tornou-se o maior motivo das jogatinas entre amigos durante o final de semana.

O Dreamcast também foi o nosso console de emulação. Na época, não tinhamos PC em casa. E descobrir que o videogame rodava bem a maioria dos jogos de NES, Super Nintendo e Mega Drive tornou o Dreamcast ainda mais especial para nós. Foi nele, por exemplo, que descobri e zerei Chrono Trigger.

Pirata mesmo

Sem a menor condição de comprar jogos originais para o Dreamcast, o jeito para manter a diversão em dia era apelar para a pirataria. Depois de uma semana inteira pesquisando por novos títulos, eu aproveitava a ida até Caicó, cidade vizinha onde eu fazia um curso de informática, para encontrar Marcelo, um vendedor de instrumentos musicais que vendia jogos piratas.

Eu entrega uma lista de jogos para Marcelo, ele baixava os games em casa, e copiava para CDs logo em seguida. Quando era no sábado seguinte, eu passava para pagar e pegar os novos discos. Nem dava tempo eu chegar em casa, os meus amigos já começavam a mandar mensagens perguntando quando eu chegaria e se tudo tinha dado certo com Marcelo.

Foram meses de diversão, descobertas e reuniões para pesquisar e comentar sobre os games do Dreamcast. Ele foi, de longe, um dos consoles que mais joguei na vida, principalmente por causa dos jogos únicos e a possibilidade de emular videogames clássicos. E saber que ele foi deixado de lado na locadora simplesmente por não possuir um jogo de futebol que agradasse a grande massa.

Eternamente Dreamcast

Fiquei com o Dreamcast do Tadeu até os últimos suspiros do seu leitor de CD. Infelizmente, o coitado não teve mais forças para aquentar o rojão das minhas jogatinas por muito tempo. Porém, enquanto funciou, o Dreamcast me encheu de alegrias e me proprocionou grandes e inesquecíveis momentos ao lado de bons amigos. E isso, nem a sua morte prematura pode apagar.


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Ítalo Chianca

Gamer que cresceu jogando com seus irmãos, lendo revistas sobre games e frequentando as antigas locadoras de videogame, hoje divide o seu tempo livre entre as jogatinas e os textos sobre games que costuma publicar no Jogo Véio e nos seus próprios livros (Videogame Locadora, Os videogames e eu, Papo de Locadora, Game Chronicles e Gamer).

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