Dezembro, final de ano, aquele cansaço de um ano inteiro de estudos e trabalho começa a pesar no corpo e na mente, descarregando o resto das nossas energias. Mas, ao mesmo tempo em que bate a tristeza de ter que levantar cedo na segunda-feira pela milésima vez, chega também o melhor período do ano: as férias. Paz, sossego, mais tempo para dormir e comer (ciclo vicioso) e, principalmente, jogar um bom jogo. Deixe suas tarefas de lado e embarque nas mais divertidas histórias de uma turma de férias, com apenas uma difícil missão: reunir-se para jogar videogame.
Férias
Fim de ano é sinal de férias, festas e encontros familiares acalorados. Para nós, gamers, ainda conseguimos acrescentar ao vasto leque de diversão muitas horas extras de jogatina. Podemos, desta forma, colocar em dia os jogos acumulados na estante, frutos de meses sem tempo de jogar os tantos lançamentos responsáveis pelo desaparecimento mágico do conteúdo das nossas carteiras.
Mas, e quando o tempo livre para jogar encontra a disponibilidade de todos os amigos de uma só vez? Só pode sair coisa boa e, consequentemente, muitas histórias incríveis para contar.
Minha geração cresceu jogando videogames, assistindo a animes e jogando futebol na rua. E pode apostar, passávamos o ano inteiro fazendo nossas atividades favoritas exaustivamente. Contudo, eram nas férias, principalmente de final de ano, que conseguíamos reunir todo mundo e multiplicar a diversão do ano inteiro nos poucos meses de folga da escola e mais tarde, do trabalho.
Diversão
Depois de passar o ano inteiro se aventurando por selvas, reinos mágicos, terras dos sonhos e num futuro não tão distante, quando chegava o final do ano, era hora de dar aquele sossego merecido e curtir uma jogatina mais leve, de preferência, cujo principal objetivo fosse a diversão na sua essência.
Então, deixando um pouco de lado as espadas, pistolas, cogumelos e naves, chegava o momento de tirar a poeira do player 2 para reunir os amigos, familiares e vizinhos na “difícil” tarefa de gastar o tempo das férias se divertindo, todos juntos, envolta de um bom e velho videogame.
Jogatina rural
Quando penso no fim do ano escolar e, consequentemente, das longas férias depois de um ano inteiro de estudos, rapidamente me vem as lembranças dos vários dias no campo, mais precisamente no sítio da família da minha mãe, onde moravam (e ainda moram) muitos dos meus mais queridos familiares.
Era numa dessas casas aconchegantes do sítio da família, na casa dos meus primos (Os Shake Brothers), que eu, meus irmãos, primos, tios e tias, curtíamos os dias longe da escola e do trabalho. Mas, para quebrar um pouco a calmaria, não podia deixar de levar na mochila nossa maior paixão na época: o Nintendo 64.
Não dava outra. Bastava chegar e a garotada já pedia para instalar. Era uma tarefa por vezes complicada. Lembro que minha tia não aceitava de bom grado a ideia de deixar esse N64 na TV da sala, pois, segundo ela e praticamente todas as mães do Brasil, o videogame ia estragar a bendita televisão. Mas, talvez por se tratar das férias e todo aquele sentimento positivo do Natal, até que a choradeira era pequena e em pouco tempo estávamos todos vidrados no saudoso 64-bit da Nintendo.
Clássicos do 64-bit
Como a maioria dos brasileiros, a turma era fã de carros e futebol. Pensando nisso, levava os jogos de acordo com os gostos coletivos do pessoal. Top Gear Rally e International Super Star Soccer 64 davam o ar da graça entre primos e tios. As frenéticas corridas de rally eram uma atração à parte. Passávamos o primeiro dia inteiro customizando os carros para poderem disputar as corridas.
O esquema de jogo era o tradicional “continuava na próxima rodada apenas o vencedor”. O grau de domínio dos veículos e o conhecimento das pistas eram tão grande, devido as várias horas de treinamento, que uma curva errada e uma freada antes da hora já mudavam completamente o resultado final.
Numa das minhas várias lembranças dessas viagens, recordo como meu padrinho Maribaldi, controlando seu carro favorito, o caminhão do leite, vencia todos nós, mesmo jogando videogame apenas uma vez por ano, justamente nessas férias que passávamos lá.
Já com International Super Star Soccer 64, a situação era de completa diversão sem muita rivalidade, pois não disputávamos partidas comuns de dois tempos. Eram apenas os pênaltis, para que qualquer um pudesse participar. Com direito a narração e comentários simultâneos, passávamos horas disputando, um contra o outro, para resolver a teima de quem era o melhor cobrador de penalidades da região — até meu padrinho Netônio me vencia aqui.
Casa de campo
Ainda sobre as jogatinas no campo, não posso deixar de citar o tempo em que ia ao sítio de um velho amigo de escola: Érick. Lá, ajudava nas atividades rurais pela manhã e passava o resto da tarde, noite e madrugada, jogando PlayStation. Foram várias horas de Resident Evil e Alone In The Dark numa velha casa meio abandonada.
Contudo, nem só de tiros e zumbis gastávamos nosso merecido descanso. Foi numa destas viagens que descobrimos o maravilhoso mundo dos simuladores de corrida. Com os primeiros títulos da série Gran Turismo, comecei a pensar seriamente em testar minhas habilidades adquiridas com os treinos num carro real. Mas meu forte mesmo era os jogos de luta.
E nada melhor do que resolver aquela rixa com um soco bem seguro na cara daquele seu amigo que acha que sabe mais do que você sobre a mitologia dos Cavaleiros do Zodíaco. Bons tempos. Mas, calma aí, não pense que eu fui um brigador de rua quando adolescente, muito pelo contrário, com meu físico de “vara de tirar coco” eu não fazia mal a uma mosca. Falo é das quase infinitas horas de jogatina com os meus amigos nos títulos da série Marvel vs Capcom.
Rivalidade virtual
Feriado era sinônimo de Marvel vs Capcom na década de 2000, pelo menos para a minha turma de amigos. Por exemplo: de santa, nossa Semana Santa não tinha nada, pois a pancadaria rolava solta nos rings do mundo virtual. Reunidos na casa do meu amigo Anderson, aquecíamos os dedos e tirávamos as desavenças de meio ano de peladas mal resolvidas. Eram uns oito amigos, todos apertados num quarto bem pequeno, com espaço apenas para uma TV, um PlayStation 2, uma estante cheia de DVDs e um sofá-cama que, para o bem de todos, tinha que ser encostado no canto da parede para que coubesse todo mundo lá.
Antes de iniciar os combates um contra um, uníamo-nos na longa missão de liberar todos os personagens secretos. Era um dia inteiro, zerando várias e várias vezes o mesmo jogo, com todos os personagens, revezando o controle entre cada um. Não era uma tarefa tão divertida, mas valia a pena para o bom proveito do restante do feriado. Com o cartel de lutadores completo, era hora da ação.
As regras para a diversão eram simples: continuava no controle aquele que vencesse, ficando ao perdedor a dor da derrota e a vez dada ao próximo. Era um vai e vem sem fim. Gritos, vaias, xingamentos e muitas risadas davam o ar de emoção nas mais de 10 horas de jogatina ininterruptas.
Irmãos contra irmãos, amigos fiéis criando inéditas desavenças, novos companheiros sendo expulsos do ciclo de amizade, tudo acontecia durante as jogatinas de Marvel vs Capcom. Começávamos pela manhã, bem cedo, e nos estendíamos até o início da noite, quando os telefones começavam a tocar, com as mães prontas para ligar para polícia em busca dos filhos foragidos. Muitas broncas depois e com a alimentação posta em dia, já me preparava para a maratona do dia seguinte.
União seguista
Justamente nas férias é que nossa união em torno das nossas paixões se fortalecia ainda mais. Eram horas de jogos, episódios seguidos dos Cavaleiros do Zodíaco e maratonas de Star Wars e O Senhor dos Anéis. Mesmo com todo esse vasto repertório de diversão, ainda eram os games que dominavam a preferência geral da galera, sem restrição de marca ou geração. Até o Dreamcast teve sua vez.
Pode não ter sido o melhor dos consoles, nem ter feito o sucesso comercial esperado, muito menos nas locadoras, mas o Dreamcast tem um lugar especial nas minhas lembranças, principalmente quando chega o final do ano. Era em sua companhia que três irmãos e um amigo convidado especial passavam horas de inusitada diversão com os mascotes da SEGA.
Pode até parecer estranho para a maioria que cresceu em disputas de tabuleiro com a turma do Mario, mas só fui experimentar Mario Party e seus minigames no Wii, muito tempo depois da febre no Nintendo 64. Porém, nem por isso deixei de jogar com os amigos o bom e velho jogo de tabuleiro por turnos virtuais.
A diferença, indo contra todo meu histórico com os consoles da Nintendo, é que em vez de ver Mario e sua turma se enfrentando em tabuleiros temáticos do Reino dos Cogumelos, disputei acirradas partidas em busca dos cristais e moedas de Sonic Shuffle. Isso mesmo, o clone de Mario Party para o Dreamcast foi responsável por divertidas partidas entre amigos.
Festa do Sonic
Era um tempo onde praticamente todos os amigos tinham um Dreamcast. Foi meio por acaso, mas uma locadora da cidade trouxe vários consoles da SEGA na época de seu lançamento. Todavia, sua baixa procura fez com que seu dono se desfizesse rapidamente daquilo que ele mesmo chamou de “bomba”. Não deu outra. Trocamos os nossos PlayStation por Dreamcast novinhos. Aí já sabe, a diversão tomou conta.
Até então jogávamos separados, cada um em sua casa controlando o ouriço corredor, mas, no meio de todas aquelas caixas de CD estava uma pérola. Não demorou mais do que um dia para que Sonic Shuffle virasse um clássico nas jogatinas de final de ano (foi justamente no feriado de Natal que jogamos pela primeira vez).
Toda semana visitávamos a casa de um dos amigos, levando o próprio controle na mochila, prontos para passarmos a tarde inteira nos tabuleiros. O player 1, claro, era o dono da casa, que sempre jogava com o Sonic; os outros, os desafiantes, alternavam entre os personagens. Até nossos pais agradeciam o fato de sempre estarmos em constante mudança de local de jogo, só assim cada casa tinha paz por alguns dias, até o desafio retornar.
Dreamcast Ostentação
Um episódio marcante do tempo de Sonic Shuffle com os amigos foi o que hoje chamamos de Dreamcast Ostentação. Como comentei antes, o dono da locadora que trouxe os Dreamcasts que nos vendeu ainda pensava que o console não tinha potencial nem para competir com o Super Nintendo, que esteve lá até os dias finais do espaço.
Para provar o contrário e mostrar aos outros jogadores que o console valia a pena, e, claro, dizer para a comunidade gamers que nós tínhamos ele em casa e o adorávamos, levamos o console para a locadora.
Lá, deixamos o “tempo aberto” (maior ostentação da época das locadoras) e juntos, os quatro, cada um com seu controle, jogamos pelas tardes e noites nas férias de janeiro durante uns três dias consecutivos. O amontoado de curiosos que se formava ao redor de nós era imenso, quase fechando as entradas do local e deixando o dono maluco por não ter investido mais naquela máquina de diversão cooperativa. Tenho certeza que muita gente passou a odiar o homem que tirou a diversão em 128-bit deles. Mas assim como os que não tinham um Dreamcast, também precisávamos jogar outras coisas.
Férias, para que te quero
Sem qualquer tipo de obrigação pelos próximos dois meses, até as piores atividades, como levantar cedo, passavam a ter outro significado. A preguiça de acordar de manhã sumia, como mágica, simplesmente pelo fato de que, desta vez, a tarefa seria um pouco mais interativa, digamos assim. Até uma hora antes do horário escolar eu já estava de pé, pronto para viajar por aí, visitando reinos fantásticos e períodos antigos da história.
Mesmo sendo maravilhoso poder jogar o dia inteiro, sem ouvir sua mãe pedindo para desligar o console para terminar as atividades de casa, o melhor mesmo era buscar um companheiro de controle, fosse na locadora ou na casa de um bom amigo. Neste quesito, eu estava bem servido: minha turma estava pronta para um bom jogo, principalmente se fosse de uma galera maluca em karts desgovernados.
Uma das melhores séries multiplayer já criadas em todos os tempos, Mario Kart foi um dos grandes responsáveis pelas melhores férias, feriados e dias de doenças inventadas da minha vida (por sorte, minha mãe não lê minhas crônicas). Reunir os amigos para disputar alucinantes corridas com a turma do Mario é uma tradição que permanece firme entre meu grupo de amigos desde meados da década de 1990, ganhando força a cada novo título. Do Super Nintendo até o Switch, passando pelo Nintendo 64 até o DS, muita coisa divertida já aconteceu entre um casco azul e outra banana na última curva da derradeira volta.
Corrida maluca
Com Super Mario Kart (SNES), eu e meus dois irmãos aprendemos que correr, enquanto esfolávamos o outro com uma rajada destruidora de cascos, era uma das melhores formas de descontar aquele castigo que um de nós levava só por ter rido da cara do outro que estava sendo educadamente punido pelos nossos pais.
No tempo do N64, vivemos o auge do multiplayer cooperativo. A nova sensação de contar com até quatro jogadores simultâneos nas pistas malucas de Mario Kart 64 resultou nas melhores partidas de todos os tempos entre nós. Como não lembrar das várias vezes em que meus dois irmãos (Igsson e Iago) corriam na contra mão, numa perseguição frenética, contra meu amigo Joanilson, que cantava vitória antes da hora.
Cascos, bananas e todo o arsenal dos pequenos corredores em direção a um piloto. Era uma choradeira sem fim. Tudo isso acontecia enquanto eu vencia, tranquilo e tirando onda em todas as corridas. Joanilson ficava enfurecido com minhas vitórias. Nem posso dizer que sinto saudades de fazê-lo comer poeira, pois Mario Kart 8 está aí para provar que minhas vitórias não eram por acaso (eterno freguês).
Após um pequeno hiato nos consoles Nintendo, voltamos a disputar os tradicionais rachas no GameCube e pouco tempo depois no Nintendo Wii. Mas nada comparado a nossa febre com o Nintendo DS. Na busca por novas experiências de jogo, reuni os amigos e compramos todos de uma só vez, oito portáteis. Cada um equipado com o seu, a insanidade das partidas tomaram conta das nossas férias de fim de ano completamente. Até hoje, quando jogo com Shy Guy, lembro das muitas vitórias que consegui com ele.
Jogatina perfeita
Nos dias de hoje, nem mesmo a distância física que nos separa é o suficiente para transformar essa tradição em lenda. Os novos recursos online nos unem ainda mais, fazendo com que eternos fregueses continuem ostentando seu posto, mesmo morando em outras cidades (um dia você consegue, Joanilson).
Vez ou outra ainda ouço o som de um ônibus encostando aqui, do lado de casa, trazendo de presente velhos amigos, prontos para passarem um final de semana diferente, como nos velhos tempos.
Acho melhor parar de contar minhas histórias de jogatinas nas férias por aqui mesmo. O cansaço de um ano inteiro de estudos e trabalho começa a bater e diminuir ainda mais o meu cosmos, deixando meu nível de Ki muito abaixo de oito mil. Sinto muito, caro leitor, mais preciso guardar os cadernos, esconder os livros e mandar umas mensagens, pois as férias estão aí. Sendo assim, tenho algumas corridas para participar, lutas para enfrentar e uns tabuleiros para resolver.