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Voltamos até o começo da Guerra dos Consoles para relembrar Michael Jackson’s Moonwalker, game de plataforma que trouxe o maior artista do mundo daquele momento para o lado da Sega na luta pelo mercado de games contra Nintendo. 

Nomes de peso

Quando o Mega Drive foi lançado em 1988, a Sega estava determinada a conquistar o mercado de games, então dominado pela Nintendo com o NES. Com um console mais poderoso do que os concorrentes, faltava apenas que o público conhecesse melhor todas as qualidades do Mega Drive. 

A primeira alternativa era lançar ótimas conversões de jogos de arcade. Nessa primeira leva, vieram Altered Beast, Space Harrier II, Ghols’n Ghost, Truxton, Golden Axe, Super Monaco GP, Strider. Para citar apenas alguns. Mas a Sega precisava de mais, principalmente no mercado americano. 

Com excelentes jogos no catálogo, o próximo passo foi buscar mais identificação do público (principalmente no mercado americano) com o seu produto. E a forma encontrada foi apostar em nomes famosos para protagonizarem jogos exclusivos para o Mega Drive.

Dessa investida, vieram games com os nomes do boxeador James Buster Douglas, o astro do futebol americano Joe Montana, o treinador de basquete Pat Riley, o golfista Arnold Palmer, o jogador de beisebol Tommy Lasorda, o jogador de hóquei Mario Lemieux e ninguém menos do que Michael Jackson

Não é a Nintendo

Com tantos nomes de peso e jogos de qualidade, a Sega deu início a uma das campanhas de marketing mais agressivas e marcantes da história dos videogames.

Intitulada Genesis Does What Nintendon’t (Genesis Faz o que o Nintendo Não Faz) a campanha contava com anúncios em revistas e jornais e propagandas memoráveis na TV. E, aproveitando do contrato com um dos maiores artistas do mundo, a Sega fez de tudo para promover o seu tão comentado jogo Michael Jackson’s Moonwalker. 

O título estampou as páginas das principais revistas de videogame da época. Era como ter os clipes, os movimentos, a voz e a música do rei do pop no conforto de casa. E tudo isso apenas no Mega Drive, graças a todo o poder do console, dizia uma das propagandas. Estava tudo lá: a música, a voz, os movimentos marcantes.

O sucesso da campanha foi tão grande, que, segundo Stefano Arnhold, presidente do conselho da Tec Toy, a Sega vendeu cerca de 550 mil Mega Drive com o jogo, apenas para mulheres. Isso só na cidade Tokyo, no Japão. 

Who’s bad

A história de Michael Jackson’s Moonwalker, no entanto, começa na Nintendo. Em entrevista para o canal da WarpZone, Stefano Arnhold revelou que o astro pop bateu primeiro na porta da Nintendo, com a intenção de apresentar um projeto de game para ser lançado pela Big-N. Porém, a ideia não foi aprovada e Michael Jackson, furioso, foi até a Sega para dar o troco na Nintendo.

A Sega, obviamente, abraçou a ideia e desenvolveu não só um jogo, mas três versões do game proposto. Primeiro veio ótimo um beat’em up para arcade. Em seguida, duas versões de uma jogo de plataforma, lançado para Master System e Mega Drive.

Uma versão para PC também foi lançada, mas não teve a participação da Sega. Inclusive, já falamos da versão para fliperamas e do jogo em 8-bits. Mas de todos os Moonwalker lançados, certamente o de Mega Drive é o mais famoso deles.

Em 16-bit

Michael Jackson’s Moonwalker foi lançado para Mega Drive em 24 de agosto de 1990, cinco dias antes do aniversário do cantor. O título, um plataforma 2D com ênfase na ação e exploração de cenários, é inspirado no filme Moonwalker, de 1988, estrelado pelo próprio Michael.

O game recria os clipes musicais que compõem o longa que divulgou o lançamento do álbum Bad, o último de Michael Jackson em parceria com o lendário produtor Quincy Jones. Além disso, trechos exclusivos, criados diretamente para o jogo, completam o pacote.

No game, assim como no filme, Michael Jackson precisa salvar as crianças raptadas pelo terrível Mr. Big. E, como a produção cinematográfica já havia ensinado, a melhor forma para isso é com muito som, gingado e coreografias mortais.

Dentro do clipe

No comando do Michael, o jogador pode usar movimentos estilizados para derrotar os inimigos de diversas maneiras. Você pode, por exemplo, dar um chute alto, jogar purpurina mágica depois de um estalar de dedos, arremessar o chapéu em várias direções, girar de forma mortal e derrotar todos na tela com uma coreografia completa. 

Todos esses detalhes e movimentos são muito bem recriados, com direito a animações complexas para cada ação do personagem. O simples ato de caminhar do protagonista é fielmente recriado. Inclusive, movimentos puramente estéticos, como fazer o moonwalk ou parar na ponta dos pés estão presentes, contando com ótimas animações. 

Se todos esses golpes coreografados já não fossem o suficiente, Michael Jackson também pode se transformar num robô invencível. Basta ele pegar uma estrela mágica em alguns cenários. Nessa forma, ele pode disparar lasers e mísseis e ainda pode ver onde as crianças estão escondidas, desde que estejam no seu campo de visão.

Além da excelente recriação do protagonista, outros personagens ao longo do jogo também possuem boas animações, com direito a sprites de gangsters, zumbis e capangas para cada sequência de dança do especial de Michael Jackson. Até os cachorros dançam em Michael Jackson’s Moonwalker.

Rei por um dia

Diferente de parte dos jogos de plataforma da época, em Moonwalker o jogador precisa dividir a atenção entre o enfrentamento de inimigos e a exploração atenta dos cenário.

Para completar as fases, é necessário encontrar todas as crianças (com um visual inspirado na personagem Katie do filme) escondidas. E para isso, é preciso vasculhar janelas, portas, carros e todo tipo de lugar suspeito. Alguns desses lugares podem revelar uma criança escondida, mas outros podem conter armadilhas e mais inimigos.

Vale lembrar que os golpes especiais do personagem consomem a barra de energia do Michael. E para recuperá-la, é preciso resgatar as crianças. Cada novo resgate gera energia extra. Ficar com pouca vida, aliás, dificulta o enfrentamento contra os inimigos, pois os golpes do personagem ficam mais fracos. 

A quantidade de crianças escondidas em cada fase é indicada no canto inferior da tela. Ao encontrar todas, Bubbles (o macaco de estimação de Michael Jackson) surge na tela indicando o final da fase. Mas para passar para o cenário seguinte, é preciso enfrentar uma nova onda de inimigos. Mas nada que alguns especiais de dança não resolvam com facilidade.

Annie, are you okay?

Assim como o visual do astro pop, a trilha sonora é caprichada, com boas recriações das canções em versões chiptunes. Os gritos e efeitos sonoros também divertem. Os cenários, embora não contem com tanta quantidade de detalhes, cumprem bem o papel de fazer o jogador se sentir dentro de um clipe, contando com detalhes fiéis ao que vimos no filme, por exemplo.

Ao todo, são cinco fases, divididas em três atos cada, com uma última fase trazendo a batalha final. 

Na primeira fase, visitamos o Club 30, cenário inspirado no clipe de Smooth Criminal, presente no filme Moonwalker. Certamente, essa é uma das fases mais marcantes do Mega Drive, com direito a introdução do Michael jogando uma moeda na vitrola que faz ecoar uma das melhores canções da carreira do cantor.

A segunda fase se chama Street, e como o nome sugere, é ambientada numa rua durante a noite, com bandidos e cachorros por todo o lado. O cenário é uma clara referência ao clipe de Beat It, do disco Thriller, com a música tocando alto durante toda a ação.

Em seguida, conhecemos Graveyard, um cemitério com zumbis e corvos vindos direto no clipe Thriller, do álbum homônimo lançado em 1982. Aqui, a canção Another Part Of Me, do álbum Bad, é quem dá o tom, diferente do que muitos esperavam (leia mais sobre a ausência da música a seguir).

A quarta fase é a inusitada Cavern . Com aranhas, bandidos armados e um cenário que não vem de nenhum clipe existente, essa é uma das fases mais difíceis do jogo. Sorte que a música tema é a dançante Billie Jean, um dos maiores sucessos da carreira do Michael Jackson lançada em 1982, no álbum Thriller. 

A última fase é a The Enemy Hideout, a base inimiga do Mr. Big protegida por robôs e capangas armados. O cenário é cheio de armadilhas por todos os lados, exigindo muita paciência e habilidade do jogador. Difícil é se manter calmo enquanto a música Bad fica tocando sem parar durante a ação.

Para encerrar o game, no entanto, o jogador é surpreendido com uma batalha final de enlouquecer. Em Michael’s Battle Plane, toda a lógica do jogo muda, dando vez para um confronto que mais lembra um jogo de tiro em primeira pessoa. É uma batalha confusa, mas não tá complicada quanto a última fase do Master System. Caso consiga completar, é só curtir o show de dança com muita música.

Cadê você, Thriller?

A ausência da música Thriller na fase do cemitério é assunto até hoje entre os entusiastas do game, pois existem versões preliminares do título que possuíam a canção no cartucho. Na versão final, contudo, a música foi substituída. 

Acredita-se que Thriller foi removida do jogo devido a problemas com direitos autorais, pois a composição é do produtor Rod Temperton, parceiro de longa data de Michael Jackson. Contudo, problemas quanto aos royalties da canção, e do próprio disco, perseguem o astro até hoje.

Um exemplo desses problemas com Thriller é a vasta lista de pessoas que exigem alguma fatia nos direitos da canção título do álbum mais vendido de todos os tempos. A atriz Ola Ray, a mocinha do videoclipe, exigia na justiça participação nos lucros da música.

Quincy Jones, produtor do álbum, também já processou o espólio de Michael Jackson por taxas de produção de Thriller. Outro nome de peso nessa lista é o direto do clipe, John Landis, que processou o cantor mesmo após a sua morte.

Será?

Talvez para evitar problemas na época, ele tenha escolhido substituir a música por uma composição própria e que, de cara, ajudaria a divulgar o seu último disco. Mas é certo que Thriller faria parte do jogo. Numa propaganda divulgada pela Sega meses antes do lançamento, é possível ver o nome da música na lista de canções do jogo.

Anos mais tarde, outra possível prova surgiu na internet. Em 2017, um colecionador conhecido como Brian, teve acesso a um cartucho com a canção Thriller tocando na fase do cemitério.

Na foto, é possível notar que, provavelmente, trata-se de uma versão do jogo ainda em desenvolvimento, datado de 24 de abril de 1990 (meses antes do lançamento oficial). A rom dessa versão, inclusive, está disponível da internet.

Clássico

Michael Jackson’s Moonwalker fez história num momento em que a Sega lutava com todas as forças para ter o espaço que merecia no mercado de jogos. O game, que trazia um dos nomes mais famosos do mundo na capa, foi alardeado de todas as formas na mídia especializada. Mas de nada adiantaria se não fosse um bom jogo.

Embora não seja um dos melhores títulos do Mega Drive, tecnicamente falando, ele possui uma importância enorme na difusão do console no começo da década de 1990. Além do mais, poder controlar o rei do pop e ouvir as suas canções no videogame de casa eram diversão garantida.

Com bons controles, desafio na medida e muita, mas muita música boa, Moonwalker é um jogo essencial da biblioteca do Mega Drive, sendo lembrado até hoje, seja pelas suas fascinantes histórias de bastidores ou pela diversão proporcionada a cada um que foi o rei do pop por um dia.

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Ítalo Chianca

Gamer que cresceu jogando com seus irmãos, lendo revistas sobre games e frequentando as antigas locadoras de videogame, hoje divide o seu tempo livre entre as jogatinas e os textos sobre games que costuma publicar no Jogo Véio e nos seus próprios livros (Videogame Locadora, Os videogames e eu, Papo de Locadora, Game Chronicles e Gamer).

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